segunda-feira, 22 de março de 2010

AMIZADE EM TOM MAIOR



(RELEITURA)

RELATO


JOÃO DE BRITTO NAMORADO


Nasceu em Ilhavo, província de Aveiro, Portugal,
em 14 de janeiro de 1896 e, lá,
teve infância e adolescência normais.

Em 1917 veio, com seu seu pai, para o Rio de Janeiro,
onde conseguiu empregar-se em nossa Marinha Mercante,
chegando a piloto de um cargueiro de longo curso,
o Corcovado.

Em uma de suas viagens, em 1922, passando por Macau,
para apanhar um carregamento de sal, conheceu Hilda,
por quem se apaixonou.
Todavia, o pai da amada impôs,
como condição para o noivado, o desembarque
de Namorado. E ele assim fez.
Deixou a marinha mercante e veio para o Rio Grande do Norte,
trabalhar na Algodoeira São Miguel, com os ingleses.
Logo em seguida conseguiu ingressar
na Prefeitura Municipal, por concurso, como contador.
De lá só saiu trinta-e-cinco anos depois, aposentado
por tempo de serviço.
Certa vez, durante a gestão de Omar O'Grady como Prefeito,
aí pelo anos quarenta, creio, chegou a governar a cidade,
no impedimento do titular.

Em 1927, Namorado casa-se com Hilda,
iniciando uma ligação bonita, lírica e romântica,
que só seria interrompida com a morte dos dois.
Caminharam até o fim, unidos e apaixonados como
no primeiro encontro. Tiveram três filhos,
e um deles, Paulo, único homem, os precedeu na morte.

 
Para complementar suas finanças, Namorado instalou,
na avenida Rio Branco, um estúdio de fotografia e,
durante a guerra,
ficou conhecido pelos americanos que aqui estiveram,
pois, além da venda de filmes e material,
de revelações e ampliações,
Namorado era um ótimo técnico no assunto,
consertando qualquer defeito em máquina fotográfica.
Foi nessa época em que mais me aproximei dele,
até mesmo pela minha mania de fotografia,
que me levou a descobrir, pelo convívio,
um ser bonito e profundamente humano.
A firma era registrada como H. Namorado, nome de Hilda,
de vez que Namorado era funcionário municipal
e não poderia ter o negócio em seu nome.
Por causa disso, de brincadeira, eu passei a tratá-lo de
seu Agá (H) e assim ficou, ao longo de
todo nosso relacionamento.

Fisicamente, seu Agá se parecia com uma figura
de El Greco, na sua longilineidade mística.
Já aposentado e depois de fechar o seu estúdio na Rio Branco,
seu Agá, para passar o tempo, montou, em sua casa,
uma pequena oficina, onde se divertia,
consertando máquinas fotográficas de amigos e conhecidos.
Isso quando não estava na sala, com Hilda,
quase sempre de mãos dadas,
ouvindo ou assistindo novelas no rádio e na televisão.

Certa vez, em uma de nossas viagens, passando por Lisboa,
minha mulher recebeu do senhor Jaime Gil Vila,
um simpático e gentil português que tinha uma loja de flores
no térreo do hotel onde estávamos hospedados,
um "bouquet" de rosas vermelhas e um pé de mangerico
(árvore símbolo de Portugal), em um pequeno vaso de cerâmica,
gravado com a palavra "amizade".
A gentileza da oferta, é claro, emocionou minha mulher
até às lágrimas e, de volta a Paris, durante o tempo que lá estivemos,
o pé de mangerico foi tratado com carinho especial,
mas, infelizmente, terminou morrendo.
Sobrou o vaso de cerâmica, com a palavra "amizade"
e um pouco de terra de Portugal,
que minha mulher resolveu trazer para o Brasil
e dar de presente a Hilda e Namorado.

O dia da entrega foi uma coisa séria.
Depois de contar a história e a origem da terra,
Namorado, tocado de emoção até a mudez completa,
mergulhava os dedos na terra do pequeno vaso,
rosto vermelho e lágrimas descendo na face magra,
como se quisesse prender nas mãos a velha pátria.
Tivemos receio que o seu também velho coração
não aguentasse a carga.

Já depois da morte de Namorado, soubemos por sua filha
Vilma Lúcia Namorado França,
casada com Aderson de Carvalho França,
nossos amigos queridos que possuem um belo garoto que,
em homenagem ao avô,
se chama João de Britto Namorado Neto,
que Hilda, a quem chamávamos, carinhosamente
de "Didizinha",
pusera aquela areia em um saquinho de seda e que,
quando Namorado morrera,
ela colocara o saquinho sob a sua cabeça,
para que ele repousasse também
sobre a terra em que nascera.

De outra feita, também em Lisboa,
o mesmo senhor Jaime Gil Vila,
que tem sempre guardado para nós um gesto bonito,
deu à minha mulher uma bela rosa, ainda em botão.
Durante três dias essa rosa nos acompanhou,
esteve no mosteiro dos Jerônimos,
foi fotografada ao lado do túmulo de Camões e,
já aberta, viajou conosco para o Brasil.
Minha mulher a colocara em dois sacos plásticos com água,
onde mergulhara sua haste e pusera o saco em sua bolsa,
deixando apenas a rosa de fora, para respirar.
Essa rosa foi vedete na viagem. Todos queriam saber dela
pelos cuidados que minha mulher lhe dispensava.
Um espanhol, que julgamos ser da galícia, pela pronúncia,
perguntou se ela era uma rosa especial.
Minha mulher respondeu que sim,
que era uma rosa recebida de um amigo vivo
e que se destinava ao túmulo de um amigo morto.
O amigo era João de Britto Namorado.
Infelizmente a rosa não chegou ao seu túmulo.
No aeroporto de Recife, um fiscal do Ministério da Saúde ou da Agricultura, tomou a rosa de minha mulher
e incinerou-a, por ser de lei, disse ele.
Não adiantaram as justificativas e as alegações sentimentais
de minha mulher e minhas.

Namorado morreu em 9 de setembro de 1974.
Didizinha falava a todo instante:
"Que saudade!
Que é que eu vou fazer aqui, sem Namorado?
Quero me encontrar com ele."
Um mês e dezoito dias depois, a 27 de outubro de 1974,
sem nenhuma doença física, Didizinha morreu.
De saudade e de amor.
Seu túmulo, no cemitério Parque,
está ao lado daquele que fora seu tudo.

Hoje, Didizinha e Seu Agá
andam de mãos dadas pela eternidade.
(Augusto Severo Neto)

Trata-se de uma história real, extraída do Livro:
De LÍRICOS e de LOUCOS,
de autoria de "Augusto Severo Neto".
No caso em tela, os personagens eram somente, líricos!

Quando, há muitos anos atrás, li este relato
pela primeira vez,
fiquei imensamente sensibilizada.
Senti-me diante de um quadro impregnado
de amor verdadeiro,
profundo, imensurável e eterno!

Agora, a emoção se repete.
A esta altura do campeonato,
com a compreensão que passei a ter sobre a força do sentimento, o amor de
João de Britto Namorado e Hilda Namorado,
parece ainda mais profundo!

Quero pois, homenagear os meus amigos portugueses:
Carlos e Rosa,
residentes em Évora, na Região do Alentejo, proprietários do espaço: (http://spaces.msn.com/webintercam/),
oferecendo-lhes esta bonita história,
por me sentir plenamente convicta de que, Eles,
que se amam profundamente,
e que sempre viveram de mãos dadas,
viverão assim, eternamente!

Cumpre-me salientar que, ontem,
movida por sentimento inexplicável,
estive no local onde repousam os personagens principais
da história, levando duas rosas vermelhas.
Fiz uma prece e lhes ofereci as rosas.
A de Hilda Namorado, externei que era um presente meu.
A de João de Britto Namorado,
tomei a liberdade de externar
que era um presente dos amigos portugueses, Carlos e Rosa!
Acho que "Seu Agá" e "Didizinha",
abstraíram o sentido da oferenda!

Confesso que saí de lá, com a sensação de haver resgatado
a bela flor sacrificada em Recife/PE,
que embora tenha sido transportada com especial carinho,
pelos amáveis portadores, teve o seu percurso interrompido,
deixando de ser entregue ao destinatário!

Encerro esta homenagem,
registrando um desejo muito especial:

Que Deus fortaleça mais e mais, a união de Carlos e Rosa!...
E que Eles continuem a passear de mãos dadas, fisicamente,
por muitos e muitos anos!

(Dilma Damasceno)
Natal/RN-Nordeste-Brasil, em 07 de Maio de 2006
http://dd-vivendo-e-aprendendo.spaces.live.com/

Adendo

Hoje, tenho “Visto de Residência” em Portugal,
e também tenho o privilégio de saborear o aconchego da amizade de
Carlos e Rosa.
De vez em quando, eu e o meu Quim, vamos a Évora,
visitá-los.
E de quando em vez, Eles nos visitam em Cascais.

Meus “Amigos Para Sempre”, Carlos e Rosa,
merecem todas as bênçãos e todas as dádivas
que somente o amor fraterno e solidário, conquista!

Com reconhecimento, admiração, e carinho,
renovo a Homenagem,
reiterando os votos para que continuem a passear de mãos dadas, fisicamente, por muitos e muitos anos...
e acrescento o desejo de que permaneçam passeando de mãos dadas, espiritualmente, para sempre!

A manifestação que segue, reafirma esta homenagem dupla,
e é composta de dois acrósticos,
que embora pequeninos e singelos,
falam sobre pessoas grandes de alma e de coração:



Carlos Ferreira, generoso ser,
Amigo certo das horas incertas
Rogo a Deus que ilumine o seu viver,
Lastreando de doce claridade,
O seu lar, cujas portas sempre abertas,
São imantadas com a AMIZADE!

                           &

Rosa Ferreira, amiga generosa,
O seu jeito de amar, é sempre amando,
Semeando o amor, e cultivando
A doce essência da SUPREMA ROSA!


(Dilma Damasceno)
Cascais-Portugal, em 22 de Março de 2010

2 comentários:

Jardineiro de Plantão disse...

Por esta não esperava, não... estou sentindo o seu sorriso ao ler estas minhas parcas palavras, fico por vezes sem letras para escrever as palavras certas e não é a primeira vez que fico quase impossibilitado para resposta, por não mesmo saber o que escrever.
A nossa amizade já tem alguns anos e espero nunca a perder, pois ter pessoa como a Senhora como amiga minha e de todos os meus já é altamente elogioso para a minha pessoa.
Sinceramente agradecido por disponibilizar uma sincera amizade e carinho com este seu amigo Alentejano.

Carlos

Anônimo disse...

Geraldo de Caicó

Olá Dilma,estive aí em Natal por apenas dois dias.Que pena! Gostaria muito de vê-la. Estamos aqui em Rondônia ao término de uma longa greve e sem sucesso. Veja meu blog.www.geraldoanizio.zip.net
Abração amiga. Sou fã dos seus poemas.